sexta-feira, 4 de junho de 2010

Era uma vez

Assisti recentemente a um filme brasileiro ótimo, embora tristíssimo, que me levou inevitavelmente à comparação com a tragédia de Tristão e Isolda.  Mais especificamente com uma tragédia posterior e que tem muitos elementos semelhantes a essa: Romeu e Julieta. Chama-se Era uma vez e conta a história de um garoto da favela que se apaixona por uma menina da Vieira Souto. Fora a paixão dos dois, há o contexto do morro e do asfalto, do pobre e do rico, que aponta como em muitos outros filmes brasileiros para a desigualdade social que se mostra explícita na paisagem da cidade maravilhosa.
Trata-se o filme de uma tragédia e quem for assistir não espere um final feliz. Como no clássico de Shakespeare, os amantes estão fadados desde o início à infelicidade. Afinal, é um amor impossível. Dois mundos tão diferentes não podem se misturar, mesmo que sejam dois jovens inocentes e apaixonados que tentem isso. Assim, uma série de enganos leva os dois a um final dramático que me fez chorar horrores. E não riam de mim porque tenho certeza que muita gente choraria. É inevitável não ficar penalizado diante da cena final. E não é só isso. O filme nos faz refletir sobre uma realidade que é muito nossa: dois jovens, cheios de sonhos, que tentam mudar seu destino e ficar juntos, mas são impedidos pelas circunstâncias, pelo preconceito, pelo medo, pela injustiça do sistema a que todos nós estamos subjugados.
O filme também me fez pensar em um outro romance que o pessoal do 1º Ano está lendo: Capitães da areia, do Jorge Amado. O menino do filme não é órfão como os meninos do livro, mas está inserido numa realidade tão cruel quanto. Talvez mais.  Ele não tem pai, mas tem mãe. Uma mãe trabalhadora, que tenta proteger os filhos mantendo-os afastados da criminalidade que impera no morro. Um dos filhos quer ser jogador de futebol, mas acaba sendo assassinado por outro garoto, chefe do tráfico, que o inveja. O outro, o mais velho, acaba sendo preso. Só sobra para a mãe, o filho mais novo, o nosso Romeu, que cresce sendo honesto e se esquivando dos perigos do morro e do asfalto, mas também sem sonhos, sem estudos, sem projetos. Até se aproximar dela, a menina que ele admira na varanda do prédio rico em frente à praia, onde trabalha vendendo cachorro-quente num quiosque. Então, ele começa a sonhar, a planejar o futuro, a querer estudar, quer merecê-la, ter o direito de amá-la. Ela, por sua vez, procura viver no seu mundo, fazer parte. Ambos não conseguem. Um dos meninos de Jorge Amado também vive um amor assim fatídico. É Pedro Bala com sua Dora. Também amor trágico, destruído pelo mesmo sistema injusto e cruel.
Bom, Era uma vez vale por tudo que eu disse antes e também pelos atores Thiago Martins e Vitria Frates que conseguem dar aos protagonistas o ar de inocência e doçura necessário para aumentar nossa indignação diante da tragédia a que estão fadados. Assistam.

Um comentário:

  1. Que lindo! Já estou interessada, como em tudo sobre cinema, música e literatura, e vou procurar para assistir. Adorei a dica, Samira! Depois volto pra deixar minha opinião.
    Beijos!

    Mariana Leite - 2º ano A

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